Meningite neoplásica como manifestação inicial de linfoma de Burkitt
Chama-se meningite neoplásica (MN) à disseminação de células neoplásicas no líquido cefalorraquidiano. Está presente em cerca de 5 a 15% dos linfomas não-Hodgkin de alto grau e é ainda menos prevalente como manifestação inicial da doença.
Relatamos um caso de Linfoma de Burkitt que se apresentou com manifestações neurológicas secundárias à MN.
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Paciente masculino, 57 anos, com quadro súbito de diplopia e aparecimento sequencial de disfonia, disfagia e incontinência urinária. Cerca de 45 dias após apresentou dor e aumento do volume abdominal e melena. Emagreceu 10 kg. Ao exame físico, apresentava paralisia facial periférica, queda do véu palatino e hemiparesia completa e proporcionada à esquerda. O exame do líquor evidenciou aumento de celularidade com intensa atipia nuclear e citoplasmática. A endoscopia digestiva alta evidenciou lesões gástricas Borrman IV, cuja análise anatomopatológica evidenciou infiltrado linfóide atípico em mucosa gástrica, compatível com linfoma. No quinto dia de internação, o paciente apresentou insuficiência respiratória aguda e foi submetido a suporte ventilatório invasivo. A radiografia de tórax evidenciava opacidade compatível com pneumonia. Iniciada antibioticoterapia, porém o paciente evoluiu com choque séptico refratário às medidas terapêuticas e evoluiu a óbito. Os exames laboratoriais do dia do óbito evidenciavam ácido úrico, desidrogenase lática, fósforo inorgânico e creatinina aumentados e hemograma com 24% de blastos no sangue periférico, corroborando a hipótese leucemização do linfoma e síndrome de lise tumoral que, juntamente com o quadro infeccioso, contribuíram para a evolução do paciente. Posteriormente, a imuno-histoquímica confirmou o diagnóstico de Linfoma de Burkitt.
O achado clínico do envolvimento do sistema nervoso central agrupado em três domínios, que podem aparecer em conjunto ou isoladamente (acometimento hemisférico cerebral, acometimento de pares cranianos, e acometimento medular), deve levantar a suspeita clínica de MN em pacientes com neoplasia conhecida ou quadro clínico compatível com doença neoplásica. Esta apresentação inicial do linfoma de Burkitt é de ocorrência rara, com poucos casos relatados na literatura. Seu diagnóstico precoce depende do conhecimento dessa associação, do alto grau de suspeição e da investigação adequada e precoce.
linfomatose meníngea; linfoma não-Hodgkin de alto grau; meningite neoplásica
Clínica Médica
UNICAMP - São Paulo - Brasil
Júlia Guimarães Fernandes Costa, Cristina Alba Lalli, Bruna Cunha Zaidan, Daniela Miti Lemos Tsukumo