Hemofilia A adquirida em paciente idoso com doença de Alzheimer, anemia severa e hematomas
A hemofilia A adquirida (HAA) é uma doença autoimune rara causada pela presença de autoanticorpos que inibem a função do fator VIII da coagulação. Diferentemente das hemofilias congênitas, nas quais predominam as hemartroses, os sangramentos são mais frequentes em mucosas e tecido conjuntivo – geralmente graves, com alta morbidade e mortalidade. Acomete, sobretudo, pessoas idosas, entre 65 e 85 anos, podendo estar associada a doenças autoimunes, malignidades e gravidez.
Relatar caso de HAA em idoso com anemia severa e hematomas.
Paciente, masculino, 82 anos, portador de doença de Alzheimer, é internado com quadro de agitação psicomotora, desorientação e história de queda da própria altura. Apresentava-se hipocorado (4+/4+), desidratado e com hematomas subcutâneos em membros superiores, membro inferior esquerdo e hipocôndrio esquerdo; sem relato de hematêmese, hematoquezia ou melena. Hemograma evidenciou anemia normocítica, normocrômica, com hemoglobina de 4,3mg/dL, RDW (Red Cell Distribution Width) de 21,4 e plaquetometria normal. Coagulograma mostrou tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPA) com relação paciente/controle de 2,5 e tempo de ativação da protrombina (TAP) normal. Exames de imagem não revelaram fraturas; tomografia de crânio e endoscopia digestiva alta sem evidências de sangramento. Colonoscopia foi contraindicada devido às condições clínicas desfavoráveis. Dosagens de imunoglobulinas, vitamina B12 e ácido fólico normais; Coombs direto negativo. O aspirado de medula óssea foi compatível com anemia carencial, pela ausência de ferro. O paciente evoluiu com extensão dos hematomas para a região do tórax e dorso, e, apesar das transfusões de concentrado de hemácias e de plasma fresco, o quadro se agravou com hemorragia alveolar e síndrome da angústia respiratória aguda, necessitando de intubação orotraqueal acoplada à ventilação mecânica.
Devido à permanência do TTPA alargado, com TAP normal, foi aventada a hipótese de hemofilia A adquirida, confirmada pela deficiência de fator VIII (2,2%) e pela presença de inibidor de fator VIII (8 Unidades Bethesda). Foram administrados prednisona e complexo protrombínico sem sucesso, evoluindo o paciente para óbito.
A HAA deve ser pensada em qualquer paciente, sobretudo idoso, com quadro de hemorragia e TTPA isoladamente alargado, sendo o reconhecimento precoce da doença mandatório para um controle hemostático eficaz e redução da mortalidade.
Hemofilia adquirida; inibidor de fator VIII; deficiência de fator VIII;anemia severa; hematomas; idoso
Clínica Médica
Thaís Nunes Chicralla, Guilherme Cruz Braga, Jamison Menezes de Souza